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Manifesto apresenta pautas e desafios da agroecologia em SC
"O Seminário sintetiza um acúmulo de muitos debates, pesquisas e dados que apontam para a necessidade de revisão do modelo de produção de alimentos aqui e no Brasil", afirma o vice-reitor da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), professor Antônio Inácio Andriolli, que participou do evento na Mesa Redonda da tarde de quinta-feira, sobre a utilização de transgênicos no País. A UFFS é uma das universidades que integra o grupo de mais de 20 instituições, entidades, associações, cooperativas e grupos que promoveram o Seminário em Pinhalzinho.
Na avaliação de Adriano Scariot, integrante da Comissão de Organização do
Seminário, e coordenador do Sindaspi/SC, o documento apresentado pelos participantes, intitulado "Manifesto
Agroecológico de Pinhalzinho", organiza as demandas da agroecologia de forma a
envolver não só os Poderes Públicos, mas a própria sociedade, no debate por
mudanças no modelo produtivo agrícola, em Santa Catarina e no Brasil. "A
questão do uso da estrutura pública de pesquisa e extensão é um dos pontos que
queremos debater. Precisamos, sim, que estas estruturas atuem no apoio ao
modelo agroecológico", observa Scariot.
Documento aponta prioridades
Entre os principais pontos aprovados no "Manifesto Agroecológico de
Pinhalzinho" estão a garantia, em todos os espaços institucionais, que a alimentação
escolar seja contemplada no mínimo por 30% de produtos oriundos da
agroecologia; a implementação de políticas públicas de incentivo à produção de
sementes básicas orgânicas; a implantação, por parte do poder público, de
linhas de crédito adequadas à agroecologia; e uma Assistência Técnica e
Extensão Rural (ATER) que leve em conta não só a produção agrícola das
famílias, mas sim o contexto cultural e social do campo.
Este último ponto, segundo os especialistas no setor, é fundamental para
garantir a redução do êxodo rural e o apoio à fixação das famílias no campo,
com qualidade de vida. Ele se une a outro ponto, o último do documento, que é a
criação de um programa para pagamento de bolsa de estímulo aos jovens
agricultores agroecológicos, para que permaneçam no campo.
Outro questão considerada fundamental é a garantia de subsídios públicos para a produção agroecológica, dirigida a agricultores em processo de transição de uma produção agroquímica para a agroecológica.
VEJA ABAIXO A ÍNTEGRA DO DOCUMENTO
MANIFESTO AGROECOLÓGICO DE PINHALZINHO
O VI Seminário Estadual de Agroecologia, realizado em Pinhalzinho, é o mais
recente resultado de uma sequência de ações e debates, iniciados em 1999, na
cidade de Rio do Sul, com o I Seminário, e que se seguiu em Chapecó (2001),
Florianópolis (2005), Lages (2008), e São Miguel do Oeste(2010).
Agora com o tema "Semeando possibilidades, colhendo novas realidades", os mais
de 2.500 presentes, entre agricultores e agricultoras, estudantes, professores,
agentes públicos, pesquisadores, técnicos, extensionistas, sindicatos,
movimentos sociais e organizações afins, oriundos de mais de 220 municípios de
diversas regiões de Santa Catarina e de outros Estados, vêm a público
apresentar o acúmulo desta caminhada de 14 anos.
Reafirmamos nosso objetivo comum de lutar para construir e estimular um modelo
de agricultura sustentável para toda a coletividade humana, baseado nos
princípios da agroecologia.
Denunciamos e repudiamos o emprego da ciência e da política a serviço de
interesses privados, que comprometem a biodiversidade no Planeta. As regras da
CTNBIO com relação aos transgênicos contrariam a biossegurança e o princípio da
precaução, e são vulneráveis aos interesses comerciais.
Repudiamos o subsídio destinado à aquisição de sementes transgênicas através de
programas públicos, como o Programa Troca-troca, do Governo do Estado de Santa
Catarina.
Da mesma forma, denunciamos e manifestamos contrariedade com os critérios de
liberação e uso de agrotóxicos já proibidos em outros países; muitos,
inclusive, proibidos nos próprios países onde são produzidos. Tais
procedimentos afrontam o direito humano mais fundamental, a vida, e comprometem
a qualidade das águas, solo e biodiversidade.
Preocupa-nos a ausência de políticas estruturantes para a permanência da
juventude no meio rural catarinense, onde se confirma um grande êxodo, perda de
identidade cultural, masculinização e envelhecimento da população camponesa.
O papel da Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) deve ir além da questão
agrícola. Precisa promover inclusão social e reintroduzir o enfoque
agroecológico como eixo das ações de governo, e não apenas como mudanças
técnicas pontuais, orientadas para a conquista de nichos de mercado de produtos
orgânicos.
A ATER também deve levar em conta, nos editais e chamamentos públicos, o
trabalho histórico das ONGs e cooperativas junto aos agricultores
agroecológicos, reconhecendo, ampliando e efetivando sua participação.
Ressaltamos o protagonismo das mulheres na agroecologia. Com sua fibra,
coragem, determinação, cuidado e amor à vida são cada vez mais determinantes
nos espaços de produção, comercialização, consumo e organização. As mulheres
fornecem exemplos que pavimentam um novo jeito de ver e fazer agricultura,
harmonizado com a natureza, com a saúde, a solidariedade, a liberdade e dignidade
humanas. As políticas públicas e ações no campo da agroecologia devem,
portanto, estar fundamentalmente orientadas para elas, suas demandas, anseios e
necessidades.
A educação e a pesquisa, principalmente a pública, devem ter como prioridade
científica e metodológica a agroecologia, promovendo o diálogo permanente entre
conhecimentos acadêmicos e populares. Essa pluralidade metodológica valoriza
diferentes estratégias para a inserção do enfoque agroecológico nas
instituições de ensino, superando a noção clássica de pesquisa &
desenvolvimento, assim como o enfoque de transferência de Tecnologia.
A inserção de alimentos da agricultura familiar agroecológica junto às
estruturas públicas consumidoras ainda é limitada, devendo ter uma maior
abertura e valorização social, democratizando o acesso ao alimento
agroecológico e oportunizando a organização e a inclusão de novas famílias.
Defendemos que os poderes Executivo e Legislativo catarinense atuem na
formulação e estruturação de políticas e programas públicos que atendam aos
interesses da agricultura familiar ecológica, além de campanhas educativas
voltadas aos agricultores e consumidores, conscientizando para uma a produção e
consumo de alimentos saudáveis.
Imbuídos deste espírito de compromisso, responsabilidade e amor pela vida
propomos:
1.
Realização de eventos regionais e estaduais que tratem e envolvam a juventude
rural, estudantes de diferentes áreas e organizações parceiras;
2.
Que o poder público, as instituições de ensino, pesquisa e extensão e os
agentes financiadores valorizem e validem o uso de tecnologias sustentáveis,
como a bioconstrução, para a habitação rural;
3.
Implementação de políticas públicas de apoio aos Sistemas Participativos de
Certificação de produtos orgânicos;
4.
Identificar e realizar esforços públicos e não públicos direcionados a organizar
as demandas por abastecimento, bem como as diferentes formas de circulação de
produtos, atendendo mercados diversos, principalmente o Institucional;
5.
Desburocratização da legislação que normatiza o credenciamento dos Organismos
Participativos de Avaliação da Conformidade Orgânica - OPAC (Instrução
Normativa 19 de 2009) a fim de facilitar a ampliação dos Sistemas
Participativos de Garantia dos produtos orgânicos e oportunizar que mais grupos
de agricultores possam organizar a sua produção e comercialização;
6.
Garantir, em todos os espaços institucionais, que a Alimentação Escolar seja
contemplada no mínimo por 30% de produtos oriundos da agroecologia;
7.
Cancelamento dos contratos de terceirização da alimentação escolar, em Santa
Catarina, em função da queda na qualidade do alimento e do desrespeito à
Lei que prevê aquisição de 30% dos produtos da agricultura familiar;
8.
Implementação de políticas públicas de incentivo a produção de sementes básicas
orgânicas por parte do Poder Público e entidades ligadas a produção
agroecológica;
9.
Moratória imediata à liberação de qualquer tipo de Organismo Geneticamente
Modificado (OGM);
10.
Proibição da utilização de sementes transgênicas nas políticas de troca-troca e
distribuição de sementes no Estado de Santa Catarina;
11.
Incorporação das mudas e sementes agroecológicas e crioulas nos programas de
troca-troca e distribuição de sementes;
12.
Implementação, por parte do poder público, de linhas de crédito sem juros, ou
com juros subsidiados específicos e adequados à agroecologia. Controles
mais rígidos e eficientes da comercialização de agrotóxicos, responsabilizando
as estruturas de vendas, agricultores e técnicos e técnicas envolvidos(as);
13.
Desburocratização da ATER pública;
14.
Aliar o conjunto de necessidades de ATER com a educação agroecológica, de modo
a aproveitar o conhecimento adquirido nas escolas, levando em conta as
necessidades que os agricultores têm em produzir com base na agroecologia;
15.
Retirada de tributos (por exemplo, ICMS) dos alimentos oriundos da Agricultura
Familiar Ecológica;
16.
Que as feiras livres e espaços de venda direta sejam considerados pelo
Ministério do Desenvolvimento Social como "equipamentos públicos de segurança
alimentar e nutricional";
17.
Que a educação formal e não formal sejam consideradas como um dos grandes
pilares de sustentação dos processos agroecológicos;
18.
Que as entidades ligadas à agroecologia se reúnam para estabelecer plano de
trabalho para a construção da Política Estadual de Agroecologia;
19.
Subsídios públicos para a produção agroecológica e agricultores em processo de
transição para a agroecologia;
20.
Criação de programa para pagamento de bolsa para estimular os jovens
agricultores agroecológicos a permanecerem no campo.
Pinhalzinho,
outono de 2013.