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Hospital compra ouro para esconder lucro em SC
Apesar de considerar legal
o perdão bilionário dado a entidades filantrópicas em 2008, a Advocacia Geral
de União (AGU) entrou na Justiça Federal para cassar o certificado que garante
ao Hospital Dona Helena, de Joinville (SC), isenção tributária em troca de
trabalho comunitário. De acordo com a denúncia, obtida com exclusividade pelo Congresso em Foco, a entidade comprou
ouro para esconder o lucro por atender pacientes por consultas particulares e
convênios sem a contrapartida prevista em lei.
A Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência
Social (Cebas), documento necessário para a entidade ser considera filantrópica
e receber isenção tributária, inclusive para importação de equipamentos e
compra de remédios, foi concedido de forma irregular pelo Conselho Nacional de
Assistência Social (CNAS), de acordo com a denúncia apresentada pela AGU à
Justiça.
A acusação principal é e que chama mais atenção dos fiscais
do governo é o fato de um ex-conselheiro do CNAS, contratado como consultor do
hospital, ter orientado a diretoria a comprar ouro para esconder lucro da
Receita Federal e manter isenção de impostos garantidos pelo título que
classifica a entidade como de assistência social. Documentos revelando essa
ação foram apreendidos durante a Operação Fariseu, da Polícia Federal e do
Ministério Público Federal (MPF), ainda em março de 2008.
A advogada da União que assina a ação resume desta maneira o
caso da compra de ouro, orientada pelo ex-conselheiro do CNAS Euclides da Silva
Machado. ?Tinha conhecimento de que o Hospital Dona Helena teve um lucro muito
grande, não obstante fosse sem fins lucrativos, razão pela qual precisava
ocultar dinheiro com a compra de ouro. Nessa linha orientou os patronos da
entidade investigada a comprar ouro, a fim de não apropriar receita todo mês e
encobrir os lucros da entidade (vide diálogo de 13/05/2006). Tal negociação com
ouro consistiu em fonte de remuneração para o conselheiro do CNAS.?
Na ação, a AGU demonstra por meio de outros documentos
apreendidos durante a Operação Fariseu que Machado tinha uma série de outros
clientes que já tinha tomado o mesmo caminho. Segundo a denúncia, foi
encontrado, por exemplo, um contrato entre um operador do mercado e uma
entidade religiosa do Rio Grande do Sul ?envolvendo a absurda quantia de 11.840
kg (onze mil, oitocentos e quarenta) quilos de ouro!?.
Presidente e prefeito
O Dona Helena tem como presidente do seu conselho
deliberativo o empresário Udo Döhler. Ele é presidente e diretor do Conselho de
Administração da Döhler, uma das maiores empresas têxteis do país, e em
novembro do ano passado foi eleito pelo PMDB prefeito de Joinville, maior cidade
de Santa Catarina e um dos principais polos econômicos do estado, em uma nova
eleição.
Apesar de não figurar entre os réus da ação, Udo é citado em
diálogos interceptados pela Operação Fariseu. Neles, o prefeito fala com o
advogado da entidade junto ao CNAS, Luiz Vicente Vieira Dutra, e mostra
conhecimento sobre as ilegalidades demonstradas pela ação e que beneficiaram,
segundo a denúncia, o hospital Dona Helena irregularmente.
Em um trecho da ação, a AGU mostra o conhecimento de Udo
sobre todo o processo, ao narrar a conduta do então advogado. ?O requerido
tinha plena ciência de que não poderia obter o certificado por meio dos
trâmites legais, uma vez que a entidade não era filantrópica, nem atendia ao
SUS, razão pela qual teve que arregimentar alguns conselheiros do CNAS para
obter uma votação favorável à entidade. Chega a informar inclusive a Udo Döhler
que o conselheiro Misael era ?nosso? (diálogo de 23/11/2006).? Misael Lima
Barreto é outro conselheiro suspeito de participar das fraudes e também acusado
de improbidade administrativa pela mesma denúncia da AGU.
O site não conseguiu o contato com o Hospital Dona Helena e
com o prefeito Udo Döehler.
Contradição
O Dona Helena, assim como o Projeto Tamar, renomada fundação de proteção às tartarugas
marinhas no litoral brasileiro, e as supostas entidades de assistência social
tinham contra elas recursos da Receita Federal que pediam o cancelamento dos
certificados já emitidos pelo CNAS ou estavam sob a investigação da Fariseu,
mas foram anistiadas em 2009 com a polêmica MP 446/2008, apelidada no Congresso
Nacional por parlamentares da oposição de ?MP da Pilantropia?. Diante de tanta
polêmica, a MP
foi devolvida pelo então presidente do Senado, senador Garibaldi Alves
(PMDB-RN), fato raro na história do Legislativo.
Por isso, as ações contra a fundação ambiental e o hospital
de Santa Catarina também demonstram que há uma evidente contradição entre a
ação do governo federal neste processo polêmico. Apesar de patrocinar por meio
da AGU essas ações contra as duas entidades, parecer dessa mesma AGU ao Supremo
Tribunal Federal (STF) considera que, apesar de ter sido rejeitada por
deputados e senadores, os efeitos da MP continuam valendo.
Ou seja, a anistia e a concessão sem critérios de
certificados no CNAS, beneficiaram as entidades acusadas de irregularidades ou
de participação e conivência com o esquema descoberto pela investigação
federal. Como base neste parecer, a Justiça Federal tem mantido o certificado
de entidades que foram questionadas pela Receita Federal ou até mesmo
investigadas pela Operação Fariseu.
?A AGU firmou entendimento de que, mesmo rejeitada, a MP
446/2008, quanto à malfadada anistia, gerou efeitos irreversíveis e tornou-se
uma espécie de ato jurídico perfeito. Essa anistia foi um erro, causou
prejuízos ao erário, mais especificamente ao orçamento da seguridade social,
beneficiando muitas entidades que não atendiam aos requisitos para gozar da
isenção de tributos e contribuições federais. Esta constatação decorre
inclusive do que restou apurado na Fariseu, cujos elementos são agora utilizados
pela própria AGU?, confirma o procurador da República atualmente em Bauru (SP)
e que atuou na força-tarefa em Brasília, Pedro Antônio de Oliveira Machado.
Baixada a poeira da crise política criada pela devolução da
MP, o governo conseguiu aprovar um projeto que afrouxou ainda mais as regras.
Trata-se da lei 12.101/2009. No artigo 31, a União decidiu que o direito à
isenção das contribuições sociais poderá ser exercido pela entidade a contar da
data da publicação da concessão de sua certificação.
Com a nova norma, não existe mais a necessidade de que a
entidade peça o benefício em processo administrativos na Receita Federal e até
evita que ela entre com ações na Justiça. Ou seja, mesmo sob suspeita, as
entidades supostamente filantrópicas ganharam mais um benefício sem que se
tenha causado nenhum alarde na imprensa e sem nenhuma implicação política como
teve a MP 446/2008.
Veja ainda:
Documento
garante isenção bilionária para entidades
MPF
acusa o Einstein de negar atendimento gratuito
Entidade
rejeita acusação sobre transplantes no SUS